Memória de uma infância pantaneira aos olhos de Manoel de Barros, retirei essa prosa poética do seu livro: Memórias inventadas - as infâncias de Manoel de Barros. Sente-se!!! abra a janela da imaginação e deixe o teu coração vibrar, pois o meu já salta, verá que é sutil a linha que separa a filosofia da poesia!
ACHADOUROS
Acho que o quintal onde a gente
brincou é maior do que a cidade. A gente só descobre isso depois de grande. A
gente descobre que o tamanho das coisas há que ser medido pela intimidade que
temos com as coisas. Há de ser como acontece com o amor. Assim, as pedrinhas do
nosso quintal são sempre maiores do que as outras pedras do mundo.Justo pelo motivo da intimidade.
Mas o que eu queria dizer sobre o quintal é outra coisa. Aquilo que a negra Pombada remanescente de escravos
de Recife, nos contava. Pombada contava
aos meninos de Corumbá sobre achadouros. Que eram buracos
que os holandeses, na fuga apressada do Brasil, faziam nos seus quintais para
esconder suas moedas de ouro, dentro de grandes baús de couro. Os baús ficavam
cheios de moedas dentro daqueles buracos. Mas
eu estava a pensar em achadouros de infância. Se a gente cavar um buraco
ao pé da goiabeira do quintal, lá estará um guri ensaiando subir na goiabeira.
Se a gente cavar um buraco ao pé do galinheiro, lá estará um guri tentando
agarrar no rabo de uma lagartixa. Sou hoje um caçador de achadouros de
infância. Vou meio dementado e enxada ás costas a cavar no meu quintal
vestígios dos meninos que fomos. Hoje encontrei um baú cheio de punhetas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário