TEMPEROS DA ALMA

Segundo Sartre, o poeta sente as palavras ou frases como coisas e não como sinais, a sua obra como um fim e não como meio, mas como uma arma em combate. Nietzsche , buscou na arte uma aprendizagem para Filosofia, mais ainda: uma experiência de vida em plenitude. Assim, por acreditar que há uma cumplicidade entre Arte e Filosofia que ambas são janelas através das quais podemos vislumbrar outras possibilidades para o pensar, analisar, comparar, conceituar e provocar mudança de atitude diante do que a vida tem de diferente .Além disso a Filosofia e a Arte provocam uma ação de desnudamento da ética e estética acordando palavras adormecidas, desencantando , encantando outras tantas palavras ditas e mal ditas. Mergulhada sobre a égide da minha própria existência como uma obra de arte em construção, da capacidade de ver no outro um outro de mim mesma e como alguém que usa da mística de encantar tornando mágico o existir lançando de outros olhares para Filosofar; compreender e viver melhor ! bem, essas foram as razões que me impulsionaram a criar esse espaço. Entre!! aqui é a nossa ágora. Traga o teu tempero: sal, alho, cravo,canela, cominho, mel, limão, gengibre ,colorau, cebola , camomila, gengibre, flores, cores, sabores , perfumes para Filosofar, Poetizar...Explicar o inexplicável, no explicável se perder para se achar,há em todos a loucura de cada um Ah! Vejo flores em você! Flor do Cerrado

domingo, 15 de agosto de 2010

DoReS eXisTeNcIaiS: CoMiDa De ALmA


A relação entre filosofia e literatura transcende os limites segmentados, departamentalizados e provocam o rompimento dos saberes dogmáticos, revelando uma aproximação entre elas, permitindo diálogo e um perfeito encontro de interlocução que ora se completam e se fundem. Se não for pela beleza da sensibilidade que determinados escritores nos apresentam a vida a ponto de nos questionarmos : E a vida que imita a arte ou arte que imita a vida? Ou pelo simples fato de fazermos uma ginástica com o pensamento conduzidos pelas marcas deixadas em textos literários por grandes filósofos ? Desvendando mistérios e construindo outros? Talvez seja simplesmente pelo fato das duas áreas de saberes desbanalizar o que nos parece banal ? aqui então entramos no campo da Filosofia ou da Literatura ? Seja qual for a resposta o perguntar é sempre importante, problematizar é necessário para construirmos novos conceitos, rever outros, veja   a crônica de Nina Horta e sinta o desconforto que ela provoca e a beleza do encontro da Literatura e a Filosofia com o tema: Comida da Alma.

Comida de alma é aquela que consola, que escorre garganta abaixo quase sem precisar ser mastigada, na hora de dor , de depressão, de tristeza pequena. Não é, com certeza, um leitão pururuca, nem um menu nouvelle seguido à risca. Dá segurança, enche o estômago, conforta a alma, lembra a infância e o costume. É a canja de mãe judia, panacéia sagrada a resolver os problemas de náusea existencial. O macarrão cabelo-de-anjo cozido mole e passado na manteiga. O caldo de galinha gelatinoso, tomado às colheradas. São as sopas. O leite quente com canela, o arroz-doce, os ovos nevados, a banana cozida na casca, as gelatinas, o pudim de leite. Nora Ephron, autora de A difícil arte de amar, com o casamento acabado, grávida, enjoada, traída, vota pelo consolo de batata: “Nada como um bom purê quando se está deprimido. Nada como ir para a cama com um prato fundo de batata já saturada de manteiga e metodicamente ir adicionando mais uma fatia fina de manteiga a cada garfada.


Comida da alma tem de ser neutra. Sorvete é comida de alma? Não é. Tem um pique gelado que a tristeza não suporta. A temperatura deve estar entre ambiente e morna. Chocolate vale? Não, nem pensar. É sexy, sedutor, pressupõe prazer e culpa. Tudo tem de ser especial na comida de alma. Tia Léonie de Proust comia seus ovos de creme em pratos rasos, com desenhos e legendas. Punha os óculos e decifrava contente: “Ali Babá e o quarenta ladrões”, ou “Aladim e a lâmpada maravilhosa”. O mingau de aveia ou fubá pode ser em prato fundo, o quadrado de manteiga se derretendo por cima. O leite em boa caneca grossa, o chá em xícara inglesa florida, e, para os casos extremos, a mamadeira, é claro. A comida, de preferência, deve ser bebida aos goles ou tomada de colher. A faca é quase sempre supérflua. Um livro português trata do assunto, mostrando que a preocupação com comidas de alma vem de longe. É O cozinheiro indispensável ( Porto, 1844), que traz um subtítulo enigmático: Guia prático dos enfermos pobres, dos doentes ricos e dos convalescentes remediados. Dá receitas como o caldo conformativo, uma papinha pastosa, de se comer com lágrimas nos olhos.

(HORTA, NINA. Não é sopa – crônicas e receitas de comida. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. P 15 -6)

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